O Discurso Proibido


O problema de aceitar discurso de ódio como exceção ao direito da livre expressão vai além do fato de que se trata de conceito subjetivo e vulnerável ao jusmalabarismo interpretativo do agente público. Odiar, poderíamos dizer, é uma necessidade humana, uma emoção que não é afastada por nossa determinação de proibir que seja pronunciada.


Não ser capaz de fazê-lo, aliás, nos impede de identificar quem são os que nos odeiam e quais são suas razões. Isso previne o diálogo honesto entre as partes, o que sabota nossas chances de eliminá-lo ou mesmo negociá-lo em termos que sejam socialmente aceitáveis. No já clássico artigo Why Can't we Hate Men¹, Suzanna Odeio Macho Walters argumenta¹ pelo direito de odiar homens. Censurar esse discurso é um grave desserviço à sociedade, já que nos impede de discutir abertamente com as Suzannas por que suas ideias deveriam ser alvo de ódio, e não homens. 

Moluscolistas e Biroleibistas, por exemplo. se odeiam de forma apaixonada. Impedir que façam do seu sentimento um ato público não vai resolver o problema, se é que há algum a ser resolvido. Mais do que uma necessidade, ódio é um direito humano, desde que exercido de forma civilizada. O exercício civil da aversão, desdém, hostilidade, ressentimento, repulsa, inimizade, rancor e antipatia é, no fim, o que significa ser civilizado, a coisa que separa o cidadão dos animais irracionais, das bestas selvagens e das bestas quadradas que acreditam que discurso de ódio constituiu exceção aceitável ao princípio do livre discurso.

Civilização não é um teatro encenado onde todos fingem se amar e trocam entre si inocuidades e afabilidades cínicas, mas o palco onde podemos conviver de forma ordeira, produtiva e harmoniosa apesar de nossas diferenças. A empreitada é viável enquanto aquilo que nos une é maior do que o que nos separa.

Biroleibina era uma afro-palmiteira que deu match em Moluscolino no Tinder, um bofe nórdico de olhos azuis que tinha atração por morenas. Durante o encontro, Moluscolino afirmou que os dois eram incompatíveis, pois ela era uma negra que votava em supremacista branco golpista de ultra-extrema direita radical. Biroleibina então perguntou qual a diferença entre não querer se relacionar com alguém por razões políticas e não querer se relacionar por razões raciais.

Ora, essa é fácil, disse Moluscolino: quando um branco não quer se relacionar com um negro, isso é racismo, já quando um negro não quer se relacionar com um branco, aí está preservando o povo negro do extermínio por miscigenação. Biroleibina então disse que não era miscigenofóbica. Pintou um clima. Em pouco tempo juntaram os trapinhos e tiveram um lindo casal de afro-fascistinhas birraciais desconstruídos. 

Ambos ainda se odeiam, mas como o amor é maior, fizeram votos de viver civilizadamente juntos na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, até que a eleição os separe. 

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