Queerlegal


Dizer que sou humorista seria piada, mas comédia, ainda que a contragosto tenha que admitir, está no meu DNA, portanto não é uma construção social. A biologia foi carrasca comigo, pois meu sonho era conseguir produzir aqueles textos cerebrais padrão artigo de revista especializada, com alto teor informativo, explicativo, argumentativo, orientativo, filosoficativo, quiçá até opinativo. Há algo em mim porém ativo, que não consigo desativar, uma urgência em gracejar, ainda que termine sem graça, talvez até desgraça.

Conteúdo não me falta, e a língua, sinto, é algo que controlo mais do que o próprio pinto, o que não é grande coisa, mas pelo menos sucinto. Vontade do artigar padrão também possuo, e sempre empunho a caneta com as melhores das intenções, daquelas das quais o inferno está cheio. Assim que dou por mim, entretanto, o que sonhava ser tese logo termina em rodeio, sarcasmo, nonsense, paródia, talvez algum neologismo fullgás (Lima, 1984). A nouveau palavrê, por falar nisso, é um vício, algo ao qual me entrego com certa reserva e apenas socialmente.

No Twitter não me faltará ocasião para tal, pois, para bem ou mal, Elon Musk finalmente comprou essa rede manicomial. Já com a mão no timão, está passando o facão em diretores, engenheiros de software e outros ideólogos inúteis. Enquanto as cabeças intoxicadas rolam e o ar se torna progressivamente mais respirável, Musk está montando um conselho de diversidade¹ unwoke, que deverá se pronunciar antes de que qualquer decisão de dar unban nos banidos ou dessacralizar os ungidos avance em meio a lágrimas e ranger de dentes. 

Diversidade woke e unwoke não são a mesma coisa, razão pela qual escolhi começar falando em biologia, aquela parte de nós que não escolhemos. A do tipo woke é biologizada, focada nas coisas que não podemos mudar, como raça, sexo e orientação bacanal, razão pela qual é por definição racista, sexista e bacanalista. Além de ser diversidade do tipo  inútil, daquelas cujo único propósito servido é o de sinalizar virtude e conformidade tribal, é também do tipo pseudo, portanto pseudodiversidade. 

A ideia de que cor, sexo e orientação bacanal importam para a patrulha, como tudo no universo woke, é só uma mentirinha, um mecanismo projetado para iludir os incautos. A única coisa relevante na diversidade woke é o alinhamento ideológico, portanto se você é bacanal não normativo, por exemplo, mas não desnormatiza conforme o prescrito em cartilha, para todos os efeitos você conta como norma, não como diversidade. 

A diversidade do conselho de Musk, por outro lado, não é woke, mas de pontos de vista. Em um ambiente deliberativo e opinativo que se pretende ativo, diversidade de pensamento é a única que realmente importa, já que se dois indivíduos sempre concordam, um deles é supérfluo. Deliberar entre mais de um exige choque, discordância, diferença, os combustíveis que desfossilizam estratégias, ações, rumos, valores e até mesmo humores.

Já temos ao menos um humorista nos altos escalões do Twitter, então o ponto de vista da comédia já está adequadamente suprido na festa da unwokracia. Elon não é nenhum Dave Chapelle, Musk dá pro gasto isso é evidente. O dono da Tesla - e agora do Twitter -  pretende salvar o meio-ambiente produzindo carros elétricos em um país onde 60% da eletricidade é gerada queimando combustíveis fósseis. É isso mesmo, gêintchy: sessenta² por cento. Isso significa que americanos queimam mais combustível fóssil do que queimariam em carros a combustão para transitar em carros movidos a eletricidade. 

Parece piada, mas não é. Estou falando daquelas piadinhas em que o sujeito ficou sem bateria no carro elétrico e é salvo por alguém que tem um gerador a gasolina para fazer aquela chupetinha delícia. É com chupetinha fóssil que o americano carrega seu Tesla, mas não vá rir disso no Twitter, pois agora por lá trata-se de humor eletricamente incorreto. Anel, rosca, rodinha, essas piadas com queimar coisas geralmente são queimadas nas redes sociais de qualquer forma, então pior do que fica não estica, ao menos não no Twitter, portanto é o que temos para o momento.

The rock is rolling. 

#Queerlegal


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