Professor Centavos
Com frequência observo que as pessoas exibem uma resistente desconfiança com resultados de estudos que fornecem evidências de que homens são sexistas. Entendo o comportamento como inadequado, pois quando desconfiamos que algo pode ser fraude, o que estamos na realidade fazendo é aceitar que existe uma chance, ainda que remota, de que não seja. Isso é mais inadequado ainda, pois a probabilidade de pesquisas desse tipo não serem fraude varia de nula a não existente, especialmente para as replicadas em matérias virais alavancadas por manchetes salafrárias. É o caso na matéria¹ clickbait do The Guardian que afirma que a probabilidade de mulheres irem a óbito no pós-operatório é 32% mais alta se forem atendidas por cirurgião homem.
A empulhação já começa na manchete, que exibe número relativo cuja função é causar o impacto emocional necessário para fazer você de otário. Conforme dados produzidos² pelo estudo citado, por exemplo, a taxa de mortalidade feminina para cirurgia cardiotoráxica é de 1% caso o cirurgião seja mulher, 1,4% caso seja homem. Uma manchete alertando sobre diferença de 1 para 1,4% não impressiona muito, mas a taxa de idiotização do consumidor de clickbait dispara para a estratosfera caso você mencione 40% de diferença. Afinal, ninguém precisa ser informado de que 40% a mais de uma merreca é uma merrequinha.
De acordo com a Dra. Angela Jerath, co-autora do estudo, uma das explicações possíveis para essa merreca é viés sexista implícito, e aqui novamente o otário vai ficar ocupado demais sendo empulhado para ter tempo de entender que é impossível ser mais pato. Sim, é possível que seja viés sexista implícito a causa da merreca. Também é possível que seja a ação telepática de unicórnios rosa de outra dimensão, erro do pesquisador, coincidência, algo desconhecido ou alguma coisa que você escolher, pois diferença mesmo não vai fazer nenhuma. Afinal, um fator que causa uma merreca de diferença equivale a um pênis de 1,4cm quando ereto. Você pode até tentar comer alguém com isso, mas o efeito obtido com sua nanochonga é desprezível, portanto pode ser desconsiderado com segurança.
Até aqui o fedor está normal, mas a catinga de bacalhau rançoso fica definitivamente insuportável com a informação de que a taxa de mortalidade para homens não muda com o sexo do cirurgião, coisa que me fez lembrar das minhas aulas com o Prof. Centavos. O nome do professor é fictício, pois o verdadeiro já esqueci, mas a lição é inesquecível: quando o caixa fecha nos centavos, com certeza estão achando que você é pato, cué cué?
Com certeza esse dado sobre mortalidade masculina é intervenção de Frida, pois é precisamente o que precisa ser encontrado para que a Dra. Angela possa enfiar sua possibilidade de viés sexista implícito pela porta dos fundos e iniciar seu debate sobre o domínio masculino da medicina cirúrgica no Reino Unido. Esse debate não seria possível se homens também tivessem taxa de mortalidade inferior quando operados por cirurgiãs mulheres, pois a conclusão mais óbvia seria a de que cirurgiãs são, em média, mais eficientes que cirurgiões na amostra analisada, observação que produziria médicas empoderadas, não vítimas do patriarcado carentes de lugar de fala.
Catinga de bacalhau rançoso, como sabemos, tem perna curta, então podemos fazer uma cirurgia na manchete do The Guardian para torná-la impublicável. A taxa de mortalidade inferior obtida por cirurgiãs quando operam mulheres não se verifica quando operam homens, o que significa que a chamada da matéria poderia ser: "cirurgiãs mulheres provocam tantos porcento mais óbitos quando operam homens". Causa possível do fenômeno: viés feminista implícito.
Por fim, podemos provar matematicamente que esse estudo, além de salafrário, é misógino. Ele afirma que pacientes mulheres, caso operadas por homens, tem 15% mais chance de resultado ruim e 32% mais chance de óbito. Em outras palavras, de acordo com os critérios da pesquisa, óbito de mulheres não é um resultado ruim. Que Frida nos proteja da Dra. Angela, agora e na hora do pós-operatório, hímen!
[¹] https://www.theguardian.com/society/2022/jan/04/women-more-likely-die-operation-male-surgeon-study