Sushi de Piranha
Hoje acordei meio índio, meio Chomski, com vontade de chomskiar a linguagem e dar aquela lambida forte na língua, Roto-Rooter style, daquelas que eu dava nos velhos tempos da brilhantina, na mão boba do banco de trás do possantão do coroa. Esse negócio de mão boba acho que nem existe mais nesses tempos em que até para encostar no ombro precisa assinar termo de consentimento em três vias registradas em cartório, tudo devidamente rasgável e revogável após os finalmentes se a piriguete acordar cocote no outro dia, ocasião em que você vai em cana pra aprender que não dá pra fazer nada sem consentimento revogável. Sim é sim, mas depois que o sim já foi, amanhã pode ser não, sim foi?
Lacraias peludas passam adiante¹ por aí um estudo linguístico empoleirado sobre a palavra puta para provar que o patriarcado é machista e misógino. O mimimi é sempre o mesmo, ecoado em vários lugares. Cão é o melhor amigo do homem, mas cadela é puta; pistoleiro é assassino, mas pistoleira é puta; homem da vida é sábio, mas mulher da vida é puta, e assim por diante. O que as peludas replicantes não sabem é que essa lista é uma peça humorística muito antiga, com palavras manipuladas a dedo para fazer piada. Ouvi pessoalmente em disco de vinil. Na época não havia Internet, então era tipo ver um stand-up no Youtube, só que sem imagem e offline. Não dava para o Google censurar também. Enfiou na vitrola, já era. Sim foi?
Cão é sinônimo de demônio, e assassino pistoleiro não é boa coisa. Antes puta do que um demônio assassino. Aventureiro e aventureira podem ter conotação negativa ou positiva, e no feminino só forçando a barra para entender que é puta. Garota de rua também forçou, e homem galinha não é bonzão. Garanhão é bonzão, galinha é homem promíscuo que não presta. Potranca ou égua seria o feminino de garanhão, mas isso não é puta nem tem conotação negativa. Piranha não é feminino de peixe, até porque a piranha pode ser macho, então nessa forçou fortíssimo e entregou o jogo. Nada disso importa, pois quando terminava dizendo que puto é irritado e puta é puta, a gente dava risada. Essa lista é manipulada e inflada para conduzir hipnoticamente o indivíduo pelo narizinho, causando o efeito que o humorista precisa para entregar no fim o gran finale. Eu faço essas marafonices o tempo inteiro, de cor e salpicado, de trás para avante, a todo instante para confundir sem fundir o cérebro do meliante.
Na foto, à direita, vemos Daniel Everett, um linguista gringo que estudou² a língua dos Pirarã. A tribo não possui palavras para mencionar o futuro nem o passado, então se comunicam apenas no tempo presente. Seu trabalho ficou famoso pois parece refutar a tese de Noam Chomski de que todas as línguas têm necessariamente certas estruturas. Pirarãs certamente não devem ter uma palavra para puta na língua. Puta é a mulher que troca sexo por dinheiro, então dá uma olhada na cara do Pirarã da foto. Essa é a cara que ele vai fazer quando o branco otário tentar explicar que tem que dar um bagulho que índio não precisa nem sabe o que é em troca de pepeca. Vai rir muito. Com certeza não vai entender também esse negócio de ter que pagar sushi pra comer piranha. Sushi de piranha pra ele é grátis. É só agarrar pelos cabelos na margem do rio e fritar. Confundeu ou não fundeu o narizinho com esse óleo?
Mas você cheirou o que fedeu com o Chomski quando soube da pesquisa de Everett e descobriu que o trabalho da vida dele estava na berlinda? Ficou PUTO! Puto é pouco, o cara ficou P da vida, putasso, emputecidíssimo. Perdeu a compostura, baixou o nível e disse que Everett é um puta farsante. Se o puta é santa eu não sei, só o que eu sei é que Chomski ficou puto. Muito puto. A verdade é que normalmente as línguas tem poucas palavras ou nenhuma palavra para o que não é comum, e muitos sinônimos para o que é comum no ambiente nativo do idioma. Pirarãs, por exemplo, devem ter múltiplos sinônimos para árvore, peixe, rio, planta, folha, terra, etc.
É verdade também que a língua hetero cis branca ocidental tem uma lista interminável de sinônimos para puta: meretriz, amásia, perdida, rameira, bagaxa, cocote, concubina, cortesã, garota de programa, marafona, messalina, mulher perdida, mulher pública, pécora, piranha, rapariga, rascoa, rascoeira, tolerada, vulgívaga, etc. É sinônimo que não acaba mais. Alguma feminista perdida por aí poderia por favor me explicar agora por que bagaxa que pariu temos essa abundância de putas toleradas no palavrório? Não é necessário uma puta palavra além de puta para falar de putas, mas temos uma rascoada de putas na língua. Vulgívaga que te deu a luz, é muita cortesã! Dá pra publicar um dicionário só com sinônimos para amásias. As raparigas, é claro, iam ficar putas com o dicionário das putas. Já as putas iam adorar serem finalmente contempladas com o tratamento VIP que messalinas, meretrizes e rameiras, mas também as mulheres públicas, sempre mereceram dos linguistas.
Puta por puto, eu também queria poder ficar puta. Como não posso, fico pute com essa puteria que essas putes aprontam no língue, no culture e nos costumixs. No meu tempo era bem diferente. Hoje cancelaram a mão boba e o Roto-Rooter, e em breve mulheres nem se irritar com calma vão poder mais, porque se elas quiserem ficar putas vão ficar putes. Ninguém consegue ficar puta direito ficando pute. Aí faz como? Enfim, os bons tempos que não voltam mais só não voltam mais para quem não os teve. Você que se vire com as putes, as garotes de programa, a papelada de consentimento revogável e com as Mari Ferrer em circulação. Se serve de consolo, minha geração teve problemas que a atual nem imagina. Imagine chegar na sexta-feira sem cheque, ter esquecido de sacar dinheiro no banco para passar o fim-de-semana, e não ter o que fazer porque não existia caixa eletrônico nem maquininha ainda. Aí faz como? Só o que restava era ficar puto. Muito puto. Putão da cara mesmo. Enfiava os dois lá atrás, rasgava com força e depois se acusava falsamente de autoestupro de vulnerável na delegacia mais próxima.
Se consegui conduzir ao menos um puto narizinho emputecido até aqui, então beijim na bunda e até segunda. Talvez antes, mas só se eu encontrar banco aberto no fim-de-semana. E cuidado com as pirarã. As pirarã são um perigo. Depois que elas te agarram na margem do rio, quando você for ver o ganso, já afogou, e se não quiser afogar elas ficam pécoras com você. Chomskiô?