Foucault e o Poder
Foucault afirmava que não há saber que não suponha e constitua, ao mesmo tempo, relações de poder. O pensador é queridinho das feministas, que se inspiraram em suas ideias para fabricar a mágica teoria universal dos muitos feminismos, que nega a existência de teorias feministas universais. O problema com a ideia de Foucault de que conhecimento e poder estão conectados é que a verdade científica, ou simplesmente verdade, se preferir, é profundamente limitante e desempoderadora pelo simples fato de não possuir proprietário. Se Einstein fosse vivo hoje e quisesse revogar sua Teoria da Relatividade, entenderíamos que ele está perdendo o juízo. Embora seja o autor, não pode simplesmente "desteorizar" a Relatividade. O poder que emana do conhecimento que produziu, de acordo com os valores científicos atuais, é nenhum.
Não é assim que Foucault enxerga o conhecimento. Supondo que a ciência médica diga que obesidade é um problema de saúde, por exemplo, você está oprimindo obesos com sua verdade limitante, exercendo seu saber de forma tirana sobre eles e fabricando uma relação de subordinação e injustiça. O gordinho pode querer que sua obesidade mórbida seja só mais uma maneira válida de existir, quer ter sua própria verdade, crer que ser obeso é algo saudável, mas um médico maligno está roubando essa escolha dele com seu poder científico opressor. É preciso, portanto, democratizar a verdade e torná-la acessível aos ânimos subjetivos das massas despossuídas de saber-poder, de forma que possam construir suas próprias verdades, suas próprias narrativas, libertos do poder enclausurante das verdades elitistas de terceiros.
Evidente que esse tipo de maneira de ver o mundo cai como uma luva para a narrativa feminista. Feministas têm o desejo de que todas as vertentes feministas sejam belas e morais, ainda que possuam proposições contraditórias. Quando uma vertente feminista defende a pornografia, aquilo é válido e positivo para a mulher. Já se outra vertente luta contra, também. Temos que adaptar as duas crenças à malignidade do patriarcado, é claro. Quando homens são contra a pornografia, aquilo é uma expressão do machismo da sociedade patriarcal opressora. Quanto são a favor da pornografia, também.
Aqui somos obrigados a observar que isso não é possível. A lei da não contradição exige que você escolha uma das duas proposições, independente de qual das duas seja a que de fato é de interesse da classe feminina. O problema é que ao fazê-lo você está limitando mulheres, querendo controlar o comportamento e a expressão delas. Ora, é justamente para isso que feministas inventaram o feminismo, para emancipar a mulher da autoridade dos homens e suas verdades masculinas, que nada mais são do que um instrumento do patriarcado usado para impedir que a mulher seja livre para fazer e ser o que quiser, desde que feministas aprovem.
Feminismo é a ideia radical de que devemos suspeitar do conhecimento masculino, suspeitar da lógica dos homens, suspeitar da ciência patriarcal e jogar tudo que nossa melhor técnica de aquisição de saber pode produzir no ralo em favor de uma nova verdade, uma verdade particular, por que não dizer, uma verdade feminina, que serve a qualquer delírio que for conveniente no momento, independente do quão contraditória e desconectada da realidade essa verdade possa ser.